Armanda Passos, uma das mais notáveis artistas plásticas portuguesas, faleceu na passada terça-feira, dia 19 de outubro de 2021, aos 77 anos, na sequência de uma doença que a afectava há meses. A sua produção artística com cores vivas foi marcada pelas figuras femininas, a sua relação com a natureza, em particular com as aves e pelo desenvolvimento de uma técnica revolucionária com a serigrafia. Deixou uma obra repleta de pinturas, desenhos e serigrafias que representam um talento que se manifestou suavemente. Actualmente, as suas peças estão presentes em várias coleções, nomeadamente do Museu Nacional de Arte Contemporânea, do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, na Fundação de Serralves e no Museu Amadeo de Souza-Cardoso.
Quem foi Armanda Passos?
A artista plástica nasceu em 1944, no Peso da Régua, e licenciou-se em Artes Plásticas na Escola Superior de Belas Artes do Porto. Afirmou em diversas entrevistas que o seu dom artístico "foi-se manifestando devagar. Achava que não era dotada para nada, especialmente para o desenho. (...) Foi com o tempo, aos poucos, que fui descobrindo.” Manifesta-se nas suas obras uma evolução em termos de técnica e de temáticas, os materiais envolventes e a prática foram se modificando através de uma evolução naturalmente artística, mas a representação da figura feminina de forma íntima, continuou a ser sempre o foco da artista. A par do percurso artístico, iniciado nos anos 1970, Armanda Passos foi professora de Tecnologia da Serigrafia no Centro de Reabilitação Vocacional da Granja e monitora de Tecnologia da Gravura na Escola Superior de Belas Artes. Em 1993, ilustrou as histórias de Jorge Listopad para a infância, reunidas em "Meio Conto", com uma série inédita de 25 guaches.
A Pintura de Armanda Passos
A pintora que criava com alma, raiva e intensidade foi reconhecida pelas obras que expressavam a intensidade e complexidade do seu espírito. Nas cores vivas dos seus retratos vemos, em jeito de sonho, as suas interpretações sobretudo da mulher, como figura e representação. Não se via notada na pintura, nem no desenho e não perspetivava um futuro artístico, contudo o destino tornou-a numa das mais predominantes artistas portuguesas, marcando a arte do final do século XX e do início do século XXI. Numa sociedade dominada por um mercado e um mundo patriarcal, Armanda Passos conseguiu evidenciar-se com as suas peças com um significado profundo ligado ao seu espaço íntimo.
“A pintura para mim é mesmo o enamoramento de me sentir melhor, para poder equilibrar-me, para me poder encontrar, é uma coisa mais pessoal.”
O sucesso nacional e internacional
As obras da artista portuguesa encontram-se em vários espaços expositivos, nomeadamente no Museu do Douro, no Peso da Régua, fruto de uma doação de 83 obras, e no Museu da Quinta de Santiago, em Matosinhos, com a doação de duas obras. Armanda Passos afirmou ao doar estas peças que o seu objetivo foi deixar os seus trabalhos a locais e pessoas que significaram alguma coisa na sua vida. Declarou Armanda Passos: "Se gostarem do meu trabalho, gostam de mim"
Pela sua relevância, também foi atribuído a um parque na zona ribeirinha, o nome da artista. Neste espaço público foram instaladas esculturas que reproduzem em grande escala as figuras emblemáticas da pintora duriense. Entre as diversas distinções que recebeu, destacou-se o prémio do Ministério da Cultura (1984) e a atribuição da Comenda da Ordem de Mérito (2012) da República Portuguesa. Ainda este ano, a obra da artista voltou a estar em destaque nas comemorações do 25º aniversário do Museu Quinta de Santiago, na exposição “25 anos depois, a Coleção de Arte Municipal, 1995-2020”. A Universidade do Porto, em 2011, homenageou a artista com duas retrospectivas, Reservas e Obra Gráfica, e a publicação de um livro-catálogo, Armanda Passos Centenário U.P. – Uma Retrospectiva, com textos de José-Augusto França, Manuel Sobrinho Simões e Luís de Moura Sobral. Em 2015, a UP apresentou a exposição "Armanda Passos – Blocos de Desenhos ESBAP". E assinalou também o 75.º aniversário da artista, em 2019, com uma nova exposição na sua galeria Casa Comum, "Armanda Passos: 75 Anos, 75 Escritas". José Saramago, Urbano Tavares Rodrigues, António Alçada Baptista, David Mourão-Ferreira, Fernando Pernes, Eduardo Prado Coelho, Vasco Graça Moura, José-Augusto França, Raquel Henriques da Silva, Lídia Jorge e Mário Cláudio foram alguns dos autores que escreveram sobre a sua pintura. Além do sucesso nacional, a artista conseguiu expandir os seus horizontes ao expor em países como Espanha, Bélgica, França e Alemanha, por ser membro do grupo "Série Artistas Impressores". Também representou Portugal em vários certames internacionais, como a V Biennal of European Graphic Art (Alemanha), a Exposition Internationale de la Gravure- "Intergrafia" (Polónia) ou o Centre de la Gravure et de l’Image Imprimée (Bélgica).