Conte-nos como surgiu o seu interesse pelo grafitti e posteriormente pelas belas artes.
Em 1998, comprei latas e fui direito a uma parede, localizado numa fábrica abandonada em Azeitao, Portugal. Quando esta odisseia começou, eu simplesmente sabia que ia ser o meu caminho. Não que iria ser artista, mas que o contacto entre uma parede, uma lata e eu era indiscutivelmente uma relação para a vida. O primeiro nome que Assinei como tag, foi ‘son’. A forma como usei a lata no primeiro dia, permaneceu igual ao longo dos anos. Foi uma ligação directa e instantânea. Foram anos de continuidade e de pintura na rua. Mais Tarde, 2012, surge um convite para um solo show. Nunca tinha pensado no graffiti desta forma. Rapidamente os convites foram chegando , o trabalho desenvolveu e comecei a traçar um caminho paralelo ao da rua. A obra em atelier. Hoje , divido me entre ambos, pois não consigo viver nem sem um, nem só com o outro.
Quais são os pontos mais extraordinários de trabalhar neste meio?
O mais extraordinário é a possibilidade que tenho de poder ser e pintar o que mais gosto. Não ha palavras para descrever o que sente ao realizar uma obra. É uma parte de mim. Que vai em cada quadro que eu pinto. É um sentimento muito especial.
Durante a sua carreira, quais são os artistas que o tem inspirado?
Jackson Pollock. Desde a forma como sempre se manteve fiel no que acreditava ao estilo que tanto o caracteriza.
Nas suas obras repletas de cores intensas, elementos abstratos e uniões de padrões, representa pessoas. São pessoas que conhece? De onde surge a inspiração para estes retratos?
Fui criado, sempre, em meios onde a estética esteve presente e desempenhava um papel presente no meu dia a dia. Os meus pais ligados à moda e decoração tiveram um papel importante na parte visual. Ao incluir uma personagem no meu trabalho, estou a criar uma fusão entre o que o ser humano consegue ser e fazer perante o meio em que se insere. As obras contém figuras criadas de propósito para se encaixarem nos meus fundos, criando simbioses entre eles. Á semelhança do que eu acho ser uma característica que o ser humano tem: a adaptação ao que o rodeia. Desta forma criei este conceito de fusão entre um abstracto e um sujeito inserido nele. O principal objectivo é chegar sempre a um resultado de equilíbrio estético entre cores e formas. Também isso me foi passado durante os anos em que vivi de perto esta ligação á moda e decoração.
Começou por produzir os seus trabalhos no espaço urbano, tendo posteriormente transitado para o espaço museológico, nomeadamente as galerias. Quais foram as vantagens e dificuldades desta mudança?
Posso afirmar que a falta de espaço em tela, comparada com uma parede, foi o meu maior desafio. Tenho um traço largo, de flow longo e isso poderia ter sido um entrave. Mas acho que ajudou a redefinir o meu conceito de tela. Desta forma, foi mais claro o que iria mudar: a dimensão. Quando alinhei a minha procura com esta nova medida de trabalho, começou a ser mais fácil o surgimento dos meus trabalhos de atelier.
Atualmente, graças às plataformas sociais, como o Instagram, as suas obras de arte ainda chegam a mais pessoas.
Na sua percepção a leitura que pretende transmitir ao seu espectador continua presente, mesmo com distância entre a imagem digital “virtual” da observação presencial/real? Receia que a execução técnica, não seja valorizada?
No meu caso, gosto de partilhar vídeos do que faço. Quem me conhece sabe que os meus videos são cheios de traços e técnicas explicitas da composição dos meus trabalhos. Ao contrario do que se possa pensar, que estou a disponibilizar os meus truques e segredos, eu não vejo esta partilha assim. Vejo-a mais como a arte em si: Só existe se for partilhada. Não devemos guarda-la . É demasiado belo, e uma oportunidade gigante de poder partilhar com o mundo o que de mais profundo sinto ao pintar cada obra.
Nos últimos anos assistimos a uma mudança de paradigma, com o mundo da arte a tornar-se cada vez mais digital. As vendas online têm vindo a crescer exponencialmente, e recentemente, surgiram os Non-fungible tokens (NFTs), a grande novidade do mundo da arte. Quais são as suas perspectivas em relação ao mercado online e aos NFTs?
Acho fenomenal esta evolução, mas para mim, ter a obra disponível fisicamente ainda se sobrepõe a qualquer outra ideia. Sou uma pessoa de toque, de observação continua, de necessidade fisiológica em poder tocar nos materiais que uso na concepção das minhas obras. Quanto ao mercado online, tornou curta a distância e possível o acesso ao mundo. É algo extraordinário.
No seu “atelier” trabalhar em diversos projetos simultaneamente: quantos trabalhos têm neste momento “em progresso”? Há algum que lhe esteja a apresentar desafios específicos que gostasse de partilhar?
Tenho a oportunidade de ter agora um atelier mais adequado ao percurso do meu trabalho.Mudei recentemente para um espaço com uma area considerável. Sou um artista que precisa de espaço quando a criações de atelier se diz respeito. Gosto de trabalhar em varias areas ao mesmo tempo. Tenho sempre vários trabalhos a serem construídos em simultâneo . Nada me deixa mais feliz que estar em várias frentes. Tenho seguramente sempre cerca de 7-8 obras a serem criadas em simultâneo. Não viajo muito, porque não sou fã de aviões ( risos ) então para poder conseguir estar presente em todas as exposições que me envolvo, as obras são enviadas. Por vezes, como a minha presença não é uma necessidade, acabo por aceitar mais trabalho e isso acaba sempre num caos de cor e grande energia no meu estúdio.
Este 2023 tenho um ano dedicado a exposições , e como tal tenho vários conceitos e ideias para cada uma delas. A variedade entre estes conceitos são um desafio constante, á semelhança do que eu procuro na arte.
Já trabalha no mundo da arte há algum tempo. Qual é o seu conselho para os jovens artistas que atualmente dão os primeiros passos neste mercado?
Numa primeira abordagem eu diria simplesmente para se manterem fieis ao que gostam e ao que possam querer desenvolver enquanto trabalho artístico. Trabalharmos arduamente em algo em que acreditamos, mesmo que não tenha resultado imediato, é a meu ver o único caminho. A sensibilidade em procurar olhar para o próprio trabalho ajuda na elaboração de um crescimento fundamentado em algo real.
Se tivesse a possibilidade de escolher uma obra de arte para a sua “coleção pessoal”, qual seria?
A minha escolha seria: Jackson Pollock - nº 31.
Por fim, qual é o artista com quem sonhava trabalhar um dia?
Gostaria de poder criar algo com o artista KAWS.