O artista José de Guimarães e o Alfabeto
José de Guimarães é uma figura incontornável da história das artes plásticas portuguesas. Com mais de 60 anos de carreira, dispõe de uma vasta e notável obra na pintura, escultura e outras atividades criativas. As viagens pela Europa, África e Ásia, definiram a sua carreira, ao estimularem o desenvolvimento de uma linguagem universal. Durante várias décadas, cada uma dessas culturas enriqueceram a sua produção, surgindo a partir desta interação intercultural a criação do alfabeto. Descubra neste artigo como o artista José de Guimarães criou este elemento criativo e linguístico.
José de Guimarães
Quem é José de Guimarães?
José Maria Fernandes Marques nasceu a 25 de Novembro de 1939, na cidade de Guimarães, ingressou na Academia Militar e no curso de Engenharia na Universidade Técnica de Lisboa em 1957, deixando assim a sua cidade natal. No ano seguinte, iniciou os estudos no âmbito da pintura e do desenho com Teresa de Sousa e Gil Teixeira Lopes. Frequentou os cursos de gravura da Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses onde conheceu Hogan, Júlio Pomar, Almada Negreiros, Bartolomeu Cid dos Santos, entre outros.
Partiu para Paris em 1961, altura em que esteve em contacto com a pintura fauve, que o acabou por influenciar no futuro. Foi neste ano que adotou o pseudónimo de José de Guimarães, em homenagem à sua terra natal. No ano seguinte viajou para Itália, onde viu as obras de Miguel Ângelo, de Morandi e Giorgio de Chirico. Em 1967, em África, integrou uma comissão de serviço militar em Angola. Foi aí que começou o interesse pela arte africana, iniciando assim a sua incursão no mundo das colagens. Na sua estadia em Luanda, também publicou o Manifesto aos pintores inconformistas - Arte Perturbadora - onde afirmou: “Aproximem-se da vida e usem as matérias do nosso tempo. Dai beleza ao aço, ao alumínio, ao betão e ao plástico.” Posteriormente, realizou viagens ao Japão, China, México e Tunísia. Foi a partir destes percursos em busca de novas realidades artísticas e as influências da arte do século XX, que José de Guimarães recolheu dados e perspectivas diversas para a criação das suas obras.
“A sua carreira definir-se-ia pela descoberta de regiões distantes e incomuns, de África ao Japão, do México à China. Cada uma destas culturas estimulou-o a desenvolver uma linguagem universal e a transmitir um universo imaginário que, afinal, reaviva a memória da própria História portuguesa, feita de enriquecedoras relações com países longínquos".
Alfabeto de José de Guimarães
O Alfabeto
Fascinado com o poder da palavra nas sociedades tribais e estudo etnológico, entre 1970 e 1974, enquanto cumpria o serviço militar, José de Guimarães criou “O alfabeto de símbolos”. Este conjunto de 150 obras entre pintura e escultura, que une o real, o pictórico e o imaginário, representa um complexo sistema de códigos desenvolvidos dos pictogramas utilizados pela etnia dos Ngoygos do enclave de Cabinda, em conjunto com a civilização portuguesa. Este alfabeto criativo, aproxima-se praticamente das ilustrações presentes nos mapas antigos no tempo dos descobrimentos, em que eram representados monstros, plantas e figuras mitológicas que surgiam em partes incógnitas.
José de Guimarães propõe com este alfabeto uma nova leitura semiótica do mundo ao reinterpretar diversos símbolos, outrora híbridos, abstratos ou geométricos. Não existem letras representadas, somente desenhos que representam histórias do imaginário do artista e da cultura dos Ngoygos do enclave de Cabinda. Desta forma, este alfabeto cria uma experiência de interculturalidade com elementos decompostos pela visão de duas culturas. José de Guimarães produziu um elemento de comunicação para o mundo, sem palavras, somente desenhos. A vantagem e o fascínio deste é a liberdade que incute no pensamento do espectador, ao permitir que cada desenho e símbolo seja interpretado com diversas possibilidades, histórias e questões a nível estético, filosófico e até mesmo identidade. Ao analisarmos a produção criativa de José de Guimarães, percebemos que este elemento de comunicação foi assim o ponto de partida, pois é possível identificar diversos símbolos do alfabeto nas suas fascinantes peças, seja de pintura ou de escultura, como na “Ilha dos Amores”, “Circo”, entre outras. Descubra as diversas peças disponíveis na P55 com símbolos do alfabeto.
"Ilhas dos Amores" de José de Guimarães