“Sem história não há desenho” — Paula Rego
A artista portuguesa Paula Rego é atualmente uma figura influente, seja no mundo artístico, como social. O jornal britânico Financial Times incluiu Paula Rego na lista, anualmente lançada, na qual são celebradas 25 mulheres de todo o mundo de diferentes indústrias com um papel preponderante no ano precedente. Ao longo da carreira, Paula Rego tem vindo a construir uma linguagem visual que combina referências literárias saídas sobretudo de obras dos séculos XIX e XX com elementos autobiográficos.
Quem é Paula Rego?
Paula Rego nasceu na capital portuguesa, em 1935, em pleno Estado Novo. Este regime e prosperidade social no estrangeiro, incentivaram a sua família, a decidir que os seus estudos fossem na Slade School of Fine Art, em Inglaterra. Aos 16 anos ingressa nesta instituição, espaço onde conheceu o seu marido, o também pintor Victor Willing. Paula Rego tem um papel fundamental na arte figurativa, revolucionando a presença feminina no campo artístico ao exaltar o papel da mulher, os seus prazeres e desafios mas também ao denunciar o autoritarismo político, a injustiça e a violência. Os seus trabalhos figurativos e narrativos, muitas vezes considerados chocantes, foram inspirados em diferentes elementos da arte erudita e da cultura popular, mas nunca são conservadoras.
A vivacidade nas obras de Paula Rego
O ponto de viragem na sua obra surgiu com a série da menina e do cão. “Nela, a figura feminina assume claramente a liderança na ação, enquanto o cão é subjugado e acarinhado. A menina faz de mãe, de amiga, de enfermeira e de amante, num jogo de sedução e de dominação que continua em obras posteriores. Tecnicamente as figuras ganham volume, o espaço ganha solidez e autonomia, a perspectiva cenográfica está montada.” Desde da década de 1960, que vive em Londres, o que lhe proporcionou a internacionalidade, principalmente a partir de 1987, quando assinou com a galeria Marlborough Fine Art. A morte do seu marido, também nesse ano, é assinalada em obras como O Cadete e a Irmã, A Partida, A Família ou A Dança, de 1988. Na década seguinte, destaca-se as obras Tempo – Passado e Presente (1990-1991) e a série de pinturas a pastel intitulada Mulher Cão, que marca o início de um novo ciclo de mulheres simbólicas. Demonstrando uma crítica ao resultado do primeiro referendo ao aborto, realizado em Portugal em 1997, pinta Aborto (1997-1999). Estas obras de Paula Rego que foram extremamente importantes para o resultado positivo do segundo referendo sobre o aborto em Portugal. Atualmente, é uma das artistas portuguesas com mais reconhecimento, principalmente pelas obras realistas que seguem a linha de Goya, Hogarth e Beckmann, e por ter explorado várias técnicas — da pintura à colagem, passando pelo desenho e pela gravura, construindo constantemente situações singulares e idiossincráticas, em qualquer meio.
"A Dança" de Paula Rego, 1988
Conhecer Paula Rego
Na Galeria 111 encontra-se patente a exposição Saudades com três dezenas de obras, abrangendo temas diversos, técnicas, e histórias pessoais. Como é referido no artigo da Visão, a exposição é "uma cápsula temporal, aferindo a transformação do seu traço naturalista e figurativo, a expressividade dos corpos em séries como a dedicada a Jane Eyre de Charlote Brontë, as cenas autobiográficas que revelam a doença prolongada do marido da artista, Victor Willing (1928-1988), os apontamentos surpreendentes – como Futebolista (2010), com uma Paula Rego em poses desportivas; ou as três obras marcantes dedicadas a Maria Madalena, pinturas recuperadas do ciclo da Virgem Maria (Anunciação, 2002), que remetem para a voz (ou a falta dela) das mulheres – uma militância constante da artista."
Além deste espaço expositivo, pode visitar a Casa das Histórias Paula Rego, uma instituição dedicada à artista com sete salas que abrigam uma extensa obra de pintura, desenho, gravura, oriunda da coleção iniciada em 2009, permite acompanhar a evolução artística de Paula Rego e da sua linguagem figurativa. Neste percurso criativo está implícita a reflexão sobre os acontecimentos pessoais e sociais. Exemplo disso, são obras como O Cerco (1976), pintura evocadora do Cerco de Lisboa, em 1384, imposto pelas tropas de Castela, a que a curadora Catarina Alfaro atribui uma “tensão trágica que reflete a história pessoal de Paula Rego, o seu isolamento artístico e a decepção sentidos no rescaldo da Revolução de 25 de Abril de 1974 em Portugal”. A coleção é dominada por criações realizadas nos anos 1980, sendo referido pela curadora: “Durante esta década, Paula Rego manifesta a sua vontade de libertação artística, de ‘fazer mais diretamente’. A presença e o confronto com as suas emoções através da pintura desencadeiam-se quando estabelece uma linguagem visual radicalmente nova para contar as suas histórias, criando um universo complexo e ambíguo em que os animais são criaturas com qualidades e comportamentos humanos, atiradas para situações peculiares, dramas vividos que invadem ruidosamente a pintura.”
Em 2017, estreou o documentário sobre a pintora, “Paula Rego, Histórias & Segredos” O realizador, Nick Willing, filho da artista, trabalhou sem um guião definido, deixando que fosse a vida da mãe a ditar a direção que o documentário tomaria. “Aos 80 anos, e para minha surpresa, a mãe aceitou falar da sua vida comigo e começou a contar-me histórias que nunca me tinha contado ou que nunca me tinha contado daquela maneira, sem truques” - Nick Willing
Da Anunciação à Adoração: O Natal contado por Paula Rego
O Aborto
A Representação dos animais na Arte
O Azulejo em Portugal