Mário Cesariny nasceu no dia 9 de Agosto de 1923 em Lisboa. Frequentou a Escola de Artes Decorativas António Arroio e estudou música com o compositor Fernando Lopes Graça. Aos 19 anos já escrevia, pintava e desenhava. Frequentou o primeiro ano de Arquitetura na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, posteriormente na Escola António Arroio, onde conheceu alguns dos futuros companheiros do surrealismo português. Envolveu-se, por pouco tempo, na corrente neorrealista. Em Paris, é aluno na Academie de La Grande Chaumiére, onde acabou por conhecer o fundador e autor do manifesto do surrealismo francês André Breton. Este acontecimento em 1947 mudou para sempre a vida de Mário Cesariny, sendo um momento determinante no desenvolvimento do seu trabalho literário. Regressou a Portugal com vontade de transgredir e de desafiar a poderosa máquina da ditadura. Queria ser livre no seu país. No ano do regresso, em 1947, integrou o Grupo Surrealista de Lisboa, por onde andavam Alexandre O´Neill, Marcelino Vespeira, António Pedro, Cândido Costa Pinto, João Moniz Pereira.
Algum tempo depois, por não concordar com a linha ideológica do grupo, afasta-se de maneira polêmica e funda o "Grupo Surrealista Dissidente", com Pedro Oom, Cruzeiro Seixas, António Maria Lisboa, entre outros. Escreveram- um manifesto coletivo” A Afixação Proibida” e promovem a primeira exposição dos Surrealistas. São tempos de afirmação de um movimento de que Mário Cesariny se ocupará mais tarde, quando decidiu escrever a história das atividades surrealistas em Portugal. No Surrealismo, Cesariny encontrou o espaço de liberdade criativa que procurava. Aqui foi pelo sonho, pela imaginação, pelo amor, assente na técnica do automatismo psíquico e do acaso, sem imposições estéticas ou morais. Tudo está de acordo com a sua personalidade inquieta, polémica, subversiva.
Principal representante do Surrealismo português, Mário Cesariny, no início da sua produção literária, mostrou-se influenciado por Cesário Verde e pelo Futurismo de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa. Ao integrar-se ao Grupo Surrealista, mudou o seu estilo, trazendo para sua obra o "absurdo”, o "insólito” e o "o inverossímil”. Além de poeta, romancista, ensaísta e dramaturgo, também dedicou-se às artes plásticas, sobretudo à pintura. Traduziu a vida em escrita e pintura, linguagens que explorava na gramática do surrealismo. Mário Cesariny é talvez o militante mais genuíno deste movimento em Portugal. Promoveu a técnica conhecida por "cadáver esquisito", que consistia na elaboração de uma obra por um grupo de pessoas, num processo em cadeia criativa, na qual cada uma dava seguimento à criatividade da anterior, resultando numa espécie de colagem de palavras, a partir apenas de um acordo inicial quanto à estrutura frásica.
Colaborou em várias publicações periódicas como Jornal de Letras e Artes e Cadernos do Meio-Dia, entre outras. Começou por se interessar pelo movimento neorealista - ainda que essa breve incursão não tenha ultrapassado mais que uma postura irónica e paródica, firmada em Nicolau Cansado Escritor - para, em 1947, regressado de Paris, onde frequentou a Academia de La Grande Chaumière e onde conheceu André Breton, fundar o movimento surrealista português. A sua postura polémica na defesa de um surrealismo autêntico levou-o, porém, a deixar o grupo no ano seguinte, para criar, com Pedro Oom e António Maria Lisboa, o grupo surrealista dissidente. Como um dos principais críticos e teóricos do movimento surrealista, manteve ao longo da sua carreira inúmeras polémicas literárias, quer contra os detratores do surrealismo quer contra os que, na prática literária, o desvirtuavam.
A sua obra poética começou por refletir, em Corpo Visível ou Discurso Sobre a Reabilitação do Real Quotidiano, o gosto pela observação irónica da realidade urbana que, fazendo-se eco de Cesário Verde, constitui ainda uma fase pouco significativa relativamente a volumes próximos da prática surrealista como Manual de Prestidigitação. Aí, a mordacidade e o absurdo, o recurso ao insólito, aliados a uma discursividade que raramente envereda por um nonsense radical, como ocorre na obra de António Maria Lisboa, permitem estabelecer, como nenhum outro autor da década de 50, um ponto de equilíbrio entre o primeiro modernismo e a revolução surrealista.
A propósito da sua pintura não faz sentido fazer uma teoria geral. Como a poesia, a pintura de Cesariny é espontânea e subversiva, marcada por uma dimensão algo mágica e onírica, com predomínio da cor, da desordem ou do caos associados ao automatismo e ao acaso próprios do surrealismo. O recurso ao "non-sense" e ao absurdo, tão caros às primeiras vanguardas, aparecem na sua obra pictórica, mas também nos objectos e nas "assemblages", a par de uma atitude estética de experimentação, através do uso de métodos menos convencionais (colagens, tintas de água) mas que se traduzem numa consistente obra plástica. Defensor e impulsionador de um movimento surrealista em Portugal, Cesariny influenciou diversos artistas portugueses, tendo visto reconhecida a sua contribuição para a arte portuguesa do século XX com a atribuição do Grande Prémio EDP 2002.
No domínio do teatro, em Um Auto Para Jerusalém, pastiche de um conto de Luís Pacheco, revela a influência de Pirandello ou da prática teatral de Alfred Jarry. No fim da década de 60 e início de 70, Mário de Cesariny encetou um trabalho de reposição da verdade histórica do movimento surrealista, coligindo os seus manifestos, editando a obra poética inédita de alguns dos seus representantes, e dando ao prelo textos seus datados do período de maior envolvimento com a teoria e prática do surrealismo, como 19 Projectos de Prémio Aldonso Ortigão seguidos de Poemas de Londres (1971), ou Primavera Autónoma das Estradas (1980) ou Titânia (1977). Em 2005, recebeu a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, entregue pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio, e, em novembro desse mesmo ano, foi galardoado com o Grande Prémio Vida Literária, uma homenagem à sua notável contribuição para a literatura portuguesa.
Da sua extensa obra literária, destaca-se o seu trabalho de antologista, compilador e historiador (polémico) das actividades surrealistas em Portugal, sendo também a sua obra poética considerada um dos mais ricos e complexos contributos para a história da poesia portuguesa contemporânea. Uma poesia primeiro de intervenção contra as poéticas dominantes, no Portugal da década de 1940, através da paródia e do pastiche sarcásticos, uma poesia da tentativa fracassada de reabilitação da realidade quotidiana e depois, sobretudo, uma poesia do amor louco, desejado, vivido ou mal vivido, abandonado ou traído, cantado ou recordado e reinventado de forma elegíaca.
Para Cesariny, homossexual assumido, o amor era "um desmesurado desejo de amizade", em que "o outro é um espelho sem o qual não nos vemos, não existimos", e "a única coisa que há para acreditar"."[É] o único contacto que temos com o sagrado. As igrejas apanharam o sagrado e fizeram dele uma coisa muito triste, quando não cruel. O amor é o que nos resta do sagrado", defendia. Da sua obra, fazem parte títulos como "Corpo Visível" (1950), "Manual de Prestidigitação" (1956), "Pena Capital", "Nobilíssima Visão" (1959), "Antologia Surrealista do Cadáver Esquisito" (1961), "A Cidade Queimada" (com arranjo gráfico e ilustrações de Cruzeiro Seixas, 1965), "Burlescas, Teóricas e Sentimentais" (1972), "Primavera Autónoma das Estradas" (1980), "O Virgem Negra. Fernando Pessoa Explicado às Criancinhas Nacionais & Estrangeiras por M.C.V." (1989) e "Titânia" (1994). Sobre as sessões para que o convidavam e em que o aplaudiam, o poeta comentava: "Estou num pedestal muito alto, batem palmas e depois deixam-me ir sozinho para casa. Isto é a glória literária à portuguesa". Em 2005, recebeu as duas únicas distinções da sua carreira: o Grande Prémio Vida Literária APE/CGD, pelo conjunto da sua obra, e a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, que lhe foi entregue pelo então Presidente da República Jorge Sampaio. Nos últimos anos de vida, desenvolveu uma frenética actividade de transformação e reabilitação ou "redenção" do real quotidiano, da qual nasceram muitas colagens com pinturas, objectos, instalações e outras fantasias materiais. Faleceu em 2006, aos 83 anos de idade, sendo o seu espólio foi doado a uma fundação de Famalicão, onde a câmara construiu um Centro de Estudos do Surrealismo (CES).